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Fredrik Backman, autor sueco, começou a publicar em 2012. A partir daí, multiplicaram-se os best-sellers. Tudo começou com En man som heter Ove (Um homem chamado Ove), publicado em Portugal pela Presença e adaptado para filme por Hannes Holm. A seguir, Saker min son behöver veta om världen (tradução livre: Coisas que o meu filho precisa de saber sobre o mundo, 2012), Min mormor hälsar och säger förlåt (A minha avó pede desculpa, 2013), Britt-Marie var här (Britt-Marie esteve aqui, 2014), Beartown (2017), Us against you (2018) e Folk med ångest (Gente Ansiosa, 2019, publicado agora em Portugal pela Porto Editora). Quase todos estes foram publicados em Portugal pela Porto Editora, excepto o primeiro, que foi editado pela Presença, e os dois cujos títulos não aparecem em português ainda não têm edição nacional. O sucesso do primeiro livro impulsionou as vendas, e o autor, que nasceu em 1982, já foi traduzido para 46 línguas.
Backman já terá vendido cerca de 15 milhões de cópias dos seus romances, o que nos leva a tentar perceber se existirá uma fórmula para se chegar a tantos leitores. No meio de tantas publicações, o sueco sobressai em número, atingindo também relevância nas adaptações para formato audiovisual que partem da sua obra. Assim sendo, e lidos os romances do autor sueco, parece-nos que é possível destrinçar o mecanismo destes best-sellers.
Desengane-se quem procurar complexidade ou uma subjectividade difícil de atingir. Ao contrário de obras como A Guerra dos Tronos, de George R. R. Martin, fundados num mundo erigido pela primeira vez, e que encantam e viciam não apenas pelo drama político, pelas personagens bem traçadas e pela escrita cuidada, mas também por uma acção imprevisível, tal como a vida, e pela humanidade que reside na luta acérrima pelo poder, a obra de Backman é de uma simplicidade tal que se compreende que chegue a tantas prateleiras por cumprir outro intento – o do entretenimento. E Backman não será particularmente profícuo, surpreendendo o leitor com guinadas estilísticas ou contornos literários por explorar.
Pelo contrário, encontrada a fórmula, Backman repetiu-a, e os milhões de leitores, aparentemente, não se queixaram nem se fartaram, continuando a ser entretidos. Assim, ao começarmos por Ove, vemos que a fórmula se repete com Britt-Marie, por exemplo. O autor começa por delinear uma personagem que chega ao leitor imbuída à primeira vista de humanidade. Ove é desagradável, anti-social, obcecado com o cumprimento das regras. Sendo inflexível, a graça torna-se evidente. O leitor vê situações em que uma das personagens fica incomodada e isso, por si só, tem um carácter lúdico.
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Para mais, o livro está escrito em pequenos capítulos, cada um com uma acção, razão pela qual o leitor vê as situações, acabando a escrita por somente veicular um sentido, não a afastando muito da posterior adaptação ao formato audiovisual. É que já tudo parece feito para isso. O ritmo é o de um filme, não há contemplações, as descrições são à justa. Ao longo da leitura, vemos Ove em cena.
Acompanhamo-lo aos 59 anos, pouco depois de ter ficado viúvo. Se, por um lado, nos compadecemos com a nova solidão, e com o que parece ter sido um amor totalizante Sonja, uma mulher que era a antítese de Ove – aberta, gentil, sociável, fácil –, por outro também revemos a vida num desfasamento entre gerações. Ove é um homem prático, exaspera-se com quem não sabe trocar um pneu ou usar uma chave de fendas. A vida é o que existe em torno do seu bairro, as regras que ali existem devem ser cumpridas por terem sido criadas.
“Pequenos capítulos, cada um com uma acção, razão pela qual o leitor vê as situações, acabando a escrita por somente veicular um sentido, não a afastando muito da posterior adaptação ao formato audiovisual. É que já tudo parece feito para isso. O ritmo é o de um filme, não há contemplações, as descrições são à justa.”
“Não há no autor sueco a tendência para grandes voos, assumindo, ao que se vê, a literatura como forma de comunicação para entreter e, o que não será coisa de somenos, para divertir. O entretenimento, ao funcionar neste suporte, é transposto para outros, onde cumpre a mesma função.”
Fonte/Referência: https://observador.pt/especiais/um-sueco-entre-milhoes-de-livros-qual-e-a-receita-de-fredrik-backman-para-best-sellers/