A notícia chegou segunda-feira com grande impacto: Roberto Carlos vai jogar pela equipa de um bar, na Sunday League inglesa. O campeão do Mundo pelo Brasil, em 2002, vai regressar ao futebol sete anos depois, para jogar num campeonato regional amador.
O antigo lateral esquerdo vai representar a equipa de um bar em Shropshiree, chamado Bull In The Barne, que conseguiu a sonante contratação por um valor de seis euros.
Mas como?, perguntará o leitor.
Era exatamente isso que se ia explicar agora. Basicamente os elementos da Bull In The Barne participaram num passatempo do eBay para equipas da Sunday League, que vendia rifas a seis euros: o prémio era ter Roberto Carlos por um jogo a defender a equipa no campeonato.
Ora os Bull In The Barne venceram e já se preparam para receber Roberto Carlos.
O antigo galáctico do Real Madrid, três vezes vencedor da Liga dos Campeões, pode esperar um campo próprio ao lado do edifício da Câmara Municipal, com balneários, o que nem sempre é normal na Sunday League, embora alguns chuveiros estejam nesta altura avariados.
«A nossa assistência são apenas alguns familiares, mas temos dois pais, o sr. e a sra. Turrall, que estão sempre presentes, faça chuva ou faça sol», disse o avançado Matthew Brown.
Para quem estava habituado a jogar perante 80 mil pessoas no Bernabéu, a Sunday League pode ser um choque. Mas o que é exatamente a Sunday League?
Antes de mais é necessário dizer que é uma verdadeira instituição no futebol inglês: são campeonatos que acontecem por todo o país, divididos por regiões, em que equipas de amigos se defrontam ao domingo. Nos campos mais inimagináveis que existem.
Graham Dodds é um inglês que trabalha num banco e há sete anos criou uma equipa em Londres para jogar a Sunday League: chama-se South London Sharks.
«Somos um grupo de amigos que já jogava e fizemos uma equipa. Somos 20 e geralmente conseguimos que 11 ou 12 apareçam para os jogos. Não treinamos, só jogamos, mas quando dá e fazemos jogos de cinco contra cinco a meio da semana», conta ao Maisfutebol.
«O que é que o Roberto Carlos pode esperar da Sunday League? Bem, o primeiro aviso que lhe posso deixar é que os campos estão cheios de ervas e pedras, é muito difícil conseguir passar a bola. Depois um conselho: não estar de ressaca é um bom princípio. É preciso falar muito, porque a maior os jogadores não treinam juntos todos os dias. Ir para um bar beber copos depois do jogo é obrigatório. Temos de falar dos erros no jogo e muitas vezes curar a ressaca com mais álcool.»
Graham Dodds é jogador, desempenha o papel de defesa central, e é o gestor da South London Sharks: é ele que trata das burocracias para inscrever a equipa e trata de convencer os amigos a aparecer. Diz que o faz com gosto e que Inglaterra não saberia viver sem as Sunday Leagus.
«Domingo de manhã, Londres, Liverpool, Manchester, Bristol, Newcastle, são centenas e centenas e centenas de jogadores que jogam na Sunday League. É uma grande tradição para os ingleses e é um momento grande do fim de semana: como os jogos são de manhã, podemos voltar para a família ou ir ver a nossa equipa preferida a um bar à tarde sem coincidir», adianta.
«As melhores equipas jogam nas Saturday Leagues . Aqui há equipas que são realmente boas e os jogadores são pagos para jogar. Dizem que as Sundays Leagues [ao domingo] são os campeonatos dos gordos e ressacados, e na maior parte das vezes é verdade.»
Alexandre Brito é instrumentista de bloco operatório num hospital em Londres e jogou, também ele, na Sunday League da capital inglesa durante vários anos.
«Joguei muitos anos futebol em Portugal e queria continuar a fazê-lo quando vim para Londres. Encontrei uma equipa chamada Brent Cross através de uns anúncios que as equipas colocam em fóruns para recrutar jogadores. Mandei uma mensagem e responderam-me para aparecer num jogo amigável. Fui e fiquei», conta em conversa com o Maisfutebol.
«Os jogadores pagam uma inscrição e depois por cada jogo paga-se três ou quatro libras para financiar o aluguer do campo e o árbitro. É uma coisa muito amadora. Mas gostei muito, foi bom para me integrar em Londres, porque tinha acabado de chegar, para conhecer novas pessoas, para trocar experiências e para mostrar a qualidade dos portugueses, que eles ficam abismados.»
Alexandre Brito diz que a Sunday League não é sequer comparável aos clubes distritais de Portugal: nem em organização, nem em talento, nem sobretudo em infraestruturas.
«O clube da minha terra, o Góis, que joga na distrital de Coimbra, é um cinco estrelas em relação a isto. Estas equipas nunca têm campo. Geralmente existem associações que têm os campos e os alugam para as equipas das Sunday Leagues. Nesse campo jogam três ou quatro equipas. Depois funciona muito como os jogos de futsal entre amigos em Portugal, têm jogadores de 17 anos que jogam contra outros de 40 e quando um jogador está cansado pede para sair», refere.
«Joguei em escolas, onde os campos são ok, não são os sintéticos de nova geração, mas são ok. Depois há os campos que são literalmente ervados. Às vezes nem balneários existem. Temos de nos mudar nas laterais do campo e há alguns jogadores que procuram um arbusto para se trocar.»
Apesar disso, o português confirma que as Sunday League são uma instituição em Inglaterra e que são encantadoras. Há um espírito de amor ao futebol que ultrapassa tudo.
«Os treinos normalmente são num parque e a malta leva balizas, pinos, sacos de bolas, leva tudo para fazer um jogo. Vê-se muito no metro grupos com essas coisas todas às costas e percebemos logo que vão treinar. Treinam muitas, muitas equipas no Regent’s Park, entre as seis e as oito da noite. Depois os treinos são sempre uma lotaria, às vezes aparecem dez jogadores e fazemos um cinco contra cento, às vezes aparecem dezoito», conta.
«As convocatórias para os jogos são feitas por whatsapp. Por isso é que cada equipa normalmente tem entre 30 e 40 elementos inscritos, para assegurar sempre onze jogadores para domingo.»
Roberto Carlos pode esperar, portanto, a experiência de uma vida.
Fonte/Referência: https://maisfutebol.iol.pt/reportagem/futebol/a-historia-da-equipa-de-um-bar-que-contratou-roberto-carlos-por-seis-euros